terça-feira, 2 de junho de 2015

Ela teria dito se houvesse tempo


Não são tratos ou contratos que mantêm as pessoas lado a lado. Não são planos nem o cesto de roupas sujas que seriam lavadas no próximo sábado que preservarão qualquer coisa. Não é aquela receita prometida para o almoço em família que garantirá algo além do agora. Até aquele download, resistente há dias, também não manterá nada. 

As coisas a serem organizadas serão, finalmente, levadas a caixas e sacolas, ainda que não do jeito pretendido. Contas ficarão esquecidas, perdões, calados, mágoas, amolecidas. Os reencontros ficarão sempre como lembranças de planos. As promessas de Ano Novo, dessa vez, terão respaldo para se eternizarem como o que são, promessas.

O livro marcado em poucas páginas antes do epílogo ficará esquecido à espera do fim. Novas canções não marcarão mais momentos recortados por fascínio ou desdém. Não haverá tempo para buscar as fotos selecionadas, que durarão mais alguns meses até pararem na lata ao lado do balcão da loja. O restante do mundo conhecido até agora, com seus sabores e desencantos, não afetará o que vier a seguir.

Por todos os dias, um pedaço morrerá também. Algumas vezes, escandalosamente, mas, em sua maioria, de modo latente. É fim que não chega ao fim e que, sequer, é reconhecido. Nunca fecha o ciclo, nunca faz sentido, nunca cabe outra chance enquanto não mais existir, mas, sim, resistir à vida.

Quaisquer possibilidades de plenitude, esvaíram-se. A ausência, visivelmente, não passará despercebida e, apenas por ter existido, não poderá ser superada. Todos os dias haverá coisas para lembrar que não há forma de saciar a falta. O que ficou necessita da atenção do que não há mais e nada pode ser feito. A cada segundo, a vitalidade que ainda existe baterá de frente ao desespero do que não pode ser mudado nunca mais.

Não há culpados, amar não é o suficiente para impedir qualquer fim, para manter qualquer coisa viva. Não é a necessidade que eterniza, a vida também sabe sorrir em piadas de mau gosto.