terça-feira, 27 de setembro de 2016

Que fique o conselho

Ei, menino, não chegue tão perto. Não que eu vá dizer que seja tarde demais, porque nunca o é, só não é a melhor hora. Ela já te notou, só decidiu não te ver. Já tem alguém ali, e ele jurou não ter medo. Nunca. De nada. Nem de perdê-la.

Não, menina, já te disse que não pode ser por vestígios. Tem que ser por amor. Por inteiro. Completo. Caso não, quem cuidará do cuidado, do tato, do contrato, do retrato? Viu no que deu sua teimosia?

Não entre aí, menino! Ela ainda não pode arrumar a bagunça e não quer que a conheça em cacos. Ali já foi paisagem, passagem de faísca da lua. Se não fosse a sua pressa, insistiria para que ficasse um pouco mais aí fora, à espera.

O mundo não vai entender, menina, isso não posso te garantir. Mas, desde sempre, por quantas vezes já foi assim? Você deveria reunir um pouco de forças à sua razão, até a chuva pode não passar. Eu prefiro respeitar sua espera, ainda que não consiga enxergar a razão da sua fé.

Talvez seja isso mesmo, menino. Talvez ela esteja torcendo para que a poeira baixe antes de sair de trás da porta. Não a olhe como uma covarde, ela não gostaria de estar onde está. Sei que também traz pedaço de dor sufocado em sua vaidade, e o tempo quem te ensinou a lidar com isso.

Cure o que desatou, menina. Seu sorriso não foi sempre assim, suas certezas já foram maiores. Você não deixou de fazer parte do mundo, sua dor não deve te pesar para sempre. Começo é mais fácil mesmo, fim que traz dor.

Sem planos, menino. Ela virá sem firmeza, pés trôpegos, buscando só um pedaço de chão firme para se reerguer. Eu sei que é forte o bastante para isso, só que não poderá se envolver com o rumo que ela traçar para se proteger. Ela vai precisar se direcionar sozinha antes.

Eu sei, menina, sei que tentou. Mas, às vezes, não basta só você. Seus erros e fraquezas não desfizeram tudo sozinhos, logo, seu empenho não poderia consertar nada sem ajuda. Esses soluços que te embalam o sono há tanto tempo não são causados só por loucura sua.

Seja paciente, menino. Ela vai recusar sua chegada, negar a sua entrada, se esconder do que for. Mas não se engane. Ela tem olhos de amor. Nos seus braços, ainda encontrará tanto desejo. Ela tem sede de ser o que sente, e você, desde que encostou, tem sido pedaço preciso.

Tenha calma, menina. Há gente à porta, querendo entrar para espiar o que te faz mulher como é. Pedi para esperar. Você precisa entender o que aconteceu, mesmo depois de já ter se passado. Sempre assim.

Conquiste o mundo, menino. Ele pode ser o que você quiser, até um pouco dela. Busque o que for preciso, inclusive, disse-lhe isso também, mesmo que o necessário já tenha doído ou sido perdido em outro momento.

Quanto a mim? Quem dera pudesse eu garantir qualquer coisa a vocês além do que vejo. Aí, sim, deixaria algo mais que boa sorte em meu sincero desejo.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Mulher do cowboy se cansa da sela

Devido à empatia que leva alguém a se tornar leitor de algo, antes que comece sua leitura, preciso dar um aviso: este é mais um texto não consensual sobre mulheres. Ah! E também não é sensual. 


Nunca entendi o fascínio que causamos às palavras. Ao mundo, sim. Às palavras, não. Ainda que cantadas, rimadas, pintadas, mulheres acabam sempre como as melhores escolhas para inspirações. Mas por quê? Não, não crie expectativas, nunca me empenhei a decifrar tal drama, modéstia à parte, caímos muito bem a enredos artísticos, soa bem assim. Sou parte dessa classe inesgotável, que não pode deixar de ser ou de fazer. Clichês ou não, já fomos tão bem descritas nas travessuras de Vargas Llosa, tão desnudadas em versos de Vinícius, tão bem cantadas nos olhos de Chico e, por que não, tão bem ouvidas pelas palavras de Clarice (que Deus e todas as frases de efeito das redes sociais a tenham!).

Porém... Ah, o porém...

A literalidade nem sempre se apresenta tão devota. Aquele papo "IN-SU-POR-TÁ-VEL" sobre machismo, por exemplo, levantado por "aquele rebanho de mal-amada", é verdadeiro até em cidades do “interiorzinho”, quiridis. Muitas vezes, com menos holofotes (apenas menos holofotes, não menos devastador). Assédio se faz presente até quando queremos estar bonitas, mas não entendem que não é este o motivo para merecermos a vaga de emprego. Não pense que é tão bobagem assim, não quando você nunca perdeu ou ganhou oportunidades pela maneira que se apresenta ao invés do que pode fazer.

Voltando a nós, as "piegas" (tanto quanto usar este termo em qualquer expressão), quantos batons vermelhos já compramos porque lemos na Cosmopolitan (sim, amo e irei protegê-la) que os lábios rubros estão causando? E o quanto nós já choramos por ouvir ecoar sentimentos? Privilégio de um gene feminino dominante que é um pouco avesso à razão? Seria uma delícia responsabilizá-lo por nos induzir a furar a dieta ou sofrer daquele mal do "dedo-podre". Porém, terei que ser cruel... Você só é a fresca, fraca, iludida se aceitar esta sela e as esporas de preconceitos que te limitam a ser o foco dos pesadíssimos julgamentos alheios (de homi, de muié, de alma penada e do que mais for...). Cabe mais em você e menos no peso que precisa levar.

Mas, não percamos a esperança, nunca nos foi muito fácil viver e assumir o artigo feminino. Acabarei meu desabafo por aqui, cause a polêmica que for, porque só precisava mesmo escancarar minhas tormentas. Há muito a ser dito e ouvido sobre esses assuntos, eles não caberiam neste texto tão leve.