quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

Estão tentando acabar com a gente

Estão tentando acabar com a gente quando nos agridem tão violentamente que fazem o sangue jorrar. Mas, também, quando nos empurram ou puxam o cabelo, e ninguém consegue ver as marcas da agressão.

Estão tentando acabar com a gente quando, no auge da nossa exposição, violação e humilhação, perguntam o porquê de não reagirmos antes, mesmo sem se importar com todo risco corrido para se quebrar um ciclo de violência.

Estão tentando acabar com a gente quando relativizam as motivações do agressor, numa comunhão velada pela busca de qualquer coisa que desqualifique vítima e imponha algum merecimento pelo que houve (já que insiste na relação, não larga esse homem, não sai de casa, não escolheu bem...).

Estão tentando acabar com a gente quando riem de misoginia, com aquela "piada" que estimula violência física, sexual ou moral contra mulher, e recorrem a termos como "vitimismo" ou "mimimi" para desqualificar quem não acha graça do que é violação.

Estão tentando acabar com a gente quando dizem, prontamente, que há exceções - como se a defesa da reputação ilibada de um fosse mais urgente que defesa da dignidade e direito à vida de uma.

Estão tentando acabar com a gente quando é tão naturalizada a violência que, diferentemente de qualquer outro enquadramento penal, a vítima é estimulada a se calar (já que vão estar juntos amanhã de novo, não é a primeira vez que acontece...).

Estão tentando acabar com a gente quando não se incomodam com o pedido de socorro, muitas vezes sem palavras até, de quem não encontra segurança na própria casa, na igreja, na escola, no trabalho.

Estão tentando acabar com a gente quando nos acusam de exageradas e, com "garantias" sem quaisquer valor, usam termos como "vai passar", "deixa isso pra lá", "as coisas não vão mudar".

Estão tentando acabar com a gente quando ridicularizam nossas falas, nossas denúncias, nossos pedidos por respeito, nossas brigas para sermos vistas e ouvidas, nossas súplicas pela vida.

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Não é aceitável se é violência

Dia 25 de novembro, instituído pela ONU, é o Dia Internacional da Não-Violência Contra a Mulher. Não vou falar sobre dados e históricos este ano (tem muito sobre isso nesse texto aqui). 

Bem, infelizmente, você já deve ter visto por aí que o Brasil ocupa o 5° lugar no ranking de feminicídio, que a cada 11 minutos é registrado estupro de uma mulher no país, ou que a cada 2 minutos é registrada uma agressão física à mulher dentro de casa - e o pavor desses números é maior para mulheres negras e com menos escolaridade. Entretanto, neste dia 25, vou destacar as violências mais sutis, aquelas reproduzidas com maior recorrência e aceitação social, contra as mulheres.

Aquela violência "aceitável" quando você define o que é permitido ou não para a construção do que é ser mulher. 

Aquela violência "aceitável" quando você impõe em quais espaços e até que ponto uma mulher deve se manifestar livremente. 

Aquela violência "aceitável" quando você não dá fala às mulheres sobre suas vivências porque você tem empatia demais com mundo para precisar ouvir de mulheres o que é violência de gênero.

Aquela violência "aceitável" quando você força alguma prática ou o sexo sem camisinha, mesmo que com "jeitinho amigável".

Aquela violência "aceitável" quando você não rechaça piadas sexistas sobre qualquer mulher - só não pode falar das "suas", né? Mas, deixa eu contar, eles falam quando você não pode "defender", viu? Afinal, toda mulher é filha/irmã/prima/esposa de alguém. 

Aquela violência "aceitável" quando você questiona a participação da vítima na violência sofrida ou, ao invés de abominar o agressor, quer saber o porquê da insistência dessa mulher na relação. 

Aquela violência "aceitável" quando você rotula mulheres a partir das suas manifestações naturais sobre sexualidade, por exemplo, como dignas de serem merecedoras de um homem ou não (e que grande prêmio, hein?). 

Aquela violência "aceitável" quando você desqualifica ideias de mulheres engajadas no feminismo ou outros movimentos sociais por estar confortável demais ao manter a sua visão de mundo voltada para o seu próprio umbigo.

Aquela violência "aceitável" quando você fortalece a cultura da pedofilia ao aceitar a sexualização de meninas dizendo que elas são responsáveis por "parecerem ser mais velhas" ou suas preferências são sempre "novinhas".

Aquela violência "aceitável" quando você reproduz comportamentos de objetificação da pornografia em suas relações, reduzindo mulheres à servidão sexual irrestrita e reforçando, além do machismo, padrões racistas.

Aquela violência "aceitável" quando você descredita totalmente (ou fica sempre com alguma dúvida sobre) tudo dito por uma mulher e se atenta a qualquer merda desde que seja dita por um cara (ou quando você se comporta como se soubesse mais sobre qualquer assunto que qualquer mulher).

Aquela violência "aceitável" quando você avalia mulheres pela sua percepção de "feminilidade" - mais ou menos inteligente a partir da cor do cabelo, mais ou menos capaz a partir do tom do batom, mais ou menos higiênica a partir da quantidade de pêlos no corpo, mais ou menos respeitável a partir do tamanho da saia.

Aquela violência "aceitável" quando você abraça os infinitos estigmas resultantes da misoginia: "mulher no volante perigo constante", "em briga de marido e mulher, não se mete a colher", "homem trai por instinto", "mulher é falsa", "mulher para casar e mulher para comer", "é a mulher que faz o homem", "mulher é histérica", "mulher nasce com instinto materno", "vai ficar para titia"...

Aquela violência "aceitável" quando você encara o mundo como um lugar em que está bom como está. E sabe o porquê disso não ser verdade? Porque, além de tudo, violência também é aquela humilhação que goteja todos os dias sobre as nossas existências de fêmeas.

quarta-feira, 30 de outubro de 2019

A violência é: patrimonial

São tantas formas de violar a existência da mulher naturalizadas na nossa sociedade que, se não houver muita exposição desses padrões distorcidos, algumas coisa nunca mudarão.  Inclusive, a ideia de que homem é mais controlado com grana que mulher - o que respalda macho querendo controlar dinheiro que a filha/esposa/namorada ganha por exemplo.

Violência patrimonial é uma forma de impor controle à mulher por meio financeiro ou de bens materiais. Sabe quando pais ou maridos controlam o dinheiro de suas companheiras ou filhas, as proíbem de trabalhar, destroem seus pertences, roupas e documentos? Pois bem! Eles estão cometendo violência doméstica contra mulheres, não tem nada de proteção, carinho ou cuidado aqui.

A Lei Maria da Penha também tipifica essa forma de violência (VIOLÊNCIA, SIM, SENHOR!):

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
(...)
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

E tem mais! Sabia que recusar pagar pensão alimentícia ou não contribuir com os gastos básicos familiares quando possui recursos também são formas de violências patrimoniais? Isso porque também são formas de impor limitações, por meio dessa recusa de manter recursos para sobrevivência dessa família.

Em caso de dúvida ou denúncias, a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência - Ligue 180, funciona 24 horas, todos os dias da semana, inclusive finais de semana e feriados, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.


terça-feira, 22 de outubro de 2019

Eu sei que vai ouvir

Sua pele tem cheiro de dia quente, que impregna as narinas de calor, convidando a aproveitar cada porção de você. Não sei se te disse o quanto te vejo de sol - pode ser esse seu signo forte, de gente que mantém os pés no chão, sabe? -, ocupando o céu sem medo de nada, até olhar nos meus olhos e saber que não pode dominar o mundo inteiro. 

Eu me divirto ao brincar com suas dúvidas. Não é por mal, é só para fingir que não ligo quando você diz que vai sumir. Ter sempre o que te dizer cala minha vontade de aceitar essa ida sem deixar uma ponta solta para você - mesmo sabendo que não vou conseguir te encaixar mais como antes da sua partida.

Sei lidar com seu sorriso baixo, como de quem não pudesse se permitir ser aberto. Eu gosto dele. Te faz parecer tímido. Mas eu sei lidar com seu gargalhar, e é por isso que insisto nele. Te provoco para te ver sorrir bobo. Aceito seu filme de comédia para te sentir rir sobre seu peito.

Gosto desse gosto que você me traz, de não saber ao certo com o que se parece. Poderia te devorar num lance de olhares ou por horas de banho. Acontece que teu sabor de incerteza já me fez mais feliz, antes da gente se tornar esse monte de coisa sem sentido. Mas, depois de tanto, não seria eu mesma se isso me bastasse - me prende pelo que faz ao meu corpo, me perde pelo que faz a minha cabeça.

quinta-feira, 13 de junho de 2019

A violência é: psicológica

Nem toda violência é facilmente reconhecida. Muitas vezes, a violência passa "despercebida" por ser respaldada em comportamentos que achamos "normais" dentro das relações. Não, não é papo "de feminista que odeia homens", "de mulher mal amada", "de gente com inveja do seu relacionamento"... O assunto deste texto é violência. Violência que, mesmo sem marcar fisicamente, agride e traz consequências devastadoras às vítimas: violência psicológica.

A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) também define violência psicológica contra mulheres dentro de suas relações afetivas e familiares.
Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
(...)
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

As motivações para esse tipo de violência podem ser várias, mas todas perpassam pelos papéis de submissão que o machismo impõe às mulheres numa sociedade estruturada em modelos que as subjugam. Pais que constrangem filhas com intuito de reprimir comportamentos, parceiros ou parceiras que sugerem ou impõem afastamento de amizades, que culpabilizam as vítimas por "provocarem" seus comportamentos agressivos, que controlam redes sociais, vida financeira ou rotinas, que criticam corpo ou capacidade intelectual ofensivamente... são exemplos de violações psicológicas.

Além do controle imediato sobre a vítima, o abusador busca reduzir a individualidade (interferindo em escolhas, roupas, posturas, ambientes...), inferiorizando sua existência (humilhação, ridicularização, "piadas ou brincadeiras", deboche...) e limitando suas ações (proibições, intimidações, exigência de obediência...).

O fato de não resultar em marcas visíveis no corpo da vítima não reduz o poder de agressão deste tipo de violência. Comportamentos e ações envolvendo ciúmes, controle, humilhações, ofensas, manipulação não são sinais saudáveis ou de demonstração de afeto, são indícios de ataques. A vítima tende a desenvolver ansiedade, baixa autoestima, complexo de inferioridade, sentimento de medo de estabelecer novos relacionamentos e até depressão, além de acabar entrando num estado de afastamento social, já que passa a temer desagradar e ser desaprovada por quem a violenta, inclusive, publicamente muitas vezes.

Não pode haver tolerância com esse tipo de violência, ainda que ela seja reforçada pela aceitação social. Não é normal ser tratada como feia ou burra, não é normal ter que prestar contas de todos os passos, não é normal estar sempre apreensiva com medo de gerar algum mal-estar, não é normal achar que mereceu ser destratada, não é normal escutar que é difícil te amar.

Ciclo da Violência

"Ah, mas por que não sai dessa relação?"

Cada caso tem sua realidade, mas, antes de "solucionar" a vida alheia, é bom lembrar como funciona o ciclo de violência:

1ª fase - aumento de tensão: o agressor se irrita, a vítima tenta "contornar"
2ª fase - ato de violência: acontece a agressão
3ª fase - lua-de-mel (reconciliação): o agressor se "arrepende" e se torna "amável" e "atencioso" até voltar à 1ª fase

O agressor não é um monstro, é alguém que, geralmente, mantém um vínculo doméstico ou afetivo muito importante com a sua vítima.


Em caso de dúvida ou denúncias, a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência - Ligue 180, funciona 24 horas, todos os dias da semana, inclusive finais de semana e feriados, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.

domingo, 5 de maio de 2019

Nesse espaço

Pode pedir o espaço que você quer ocupar. 
Pode beijar meu sorriso. 
Pode ocupar essa cama. 
Pode querer ir mais cedo. 
Pode desenhar pelo meu corpo toda a sua vontade. 
Pode deixar sua bagunça à mostra. 
Pode espalhar mais de você pelos cantos em mim. 
Pode estremecer sob meu toque. 
Pode ficar em silêncio. 
Pode ficar à vontade. 
Pode perder o controle. 
Pode esperar pelo amanhecer. 
Pode escolher meu abraço. 
Pode buscar meu olhar
Pode querer ter razão. 
Pode me incomodar. 
Pode se impregnar com meu cheiro. 
Pode dizer o que sente. 
Pode escolher outro filme. 
Pode perder suas chaves. 
Pode tirar suas meias. 
Pode dormir por aqui. 
Pode andar por aí. 
Pode pedir mais um pouco. 
Pode ficar sem palavras. 
Pode contar suas histórias. 
Pode se agarrar em mim. 
Pode ir sem olhar para trás. 
Pode mudar de opinião. 
Pode sussurrar seu querer. 
Pode mostrar seu cansaço. 
Pode sufocar o vazio.
Pode ser manhã nublada.
Pode sentir todos os dias. 
Pode encarar o que sou. 
Pode manter seus segredos. 
Pode esperar pela próxima. 
Pode entrar na minha dança. 
Pode deixar a raiva passar. 
Pode sorrir ao sair.
Pode vir.

Só não promete nada.

Não diz que sou perfeita. 
Não jura ser conforto. 
Não traz a espera. 
Não vem sem querer. 
Não faz e desfaz.

Sem promessas. Com elas, não quero lidar.

quarta-feira, 3 de abril de 2019

A violência é: sexual

A dominação do corpo por meio da violência - física ou psicológica, com agressões ou ameaças - é resultado da recusa da condição de humanidade à mulher. Violar a sexualidade é, em regra, crime de opressão do macho à fêmea - controlando a liberdade sexual da mulher, negando o direito à recusa, reduzindo o corpo feminino à servidão imediata ao interesse do homem.

A Lei Maria da Penha aborda a violência sexual cometida em contexto doméstico e familiar - ou seja, os autores das agressões citadas na Lei são pessoas que têm ou tiveram alguma relação com a vítima. Então, na Maria da Penha, a violência sexual é atrelada a práticas que acontecem a partir da existência de uma relação. É preciso que haja ou tenha havido essa "ligação" entre agressor e vítima. Eu vou começar falando sobre os conceitos que ela traz, mas vou abranger depois para violências sexuais em cenários além, certo?
Art. 7o  São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
(...)
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
Outra referência legal que usarei neste texto é nosso Código Penal. Quanto a alguns crimes de cunho sexual - e aqui não interessa relação entre vítima e agressor -, o CP brasileiro traz estas definições:
Estupro:
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.
Estupro de vulnerável:
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: 
 § 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
Importunação sexual:
Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro.
Registro não autorizado da intimidade sexual: 
Art. 216-B.  Produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes.
Divulgação de cena de sexo, de nudez ou de estupro:
Art. 218-C.  Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia.
Assédio sexual 
Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.

Mas, como entender o que é violência sexual? Vamos com alguns exemplos:

  • É bem óbvio, mas há quem esqueça, então, antes de qualquer coisa, deixando bem claro: A VÍTIMA NUNCA É CULPADA.
  • Não é preciso que ocorra um estupro para que você se torne vítima de violência sexual (tem algumas formas elencadas nesses trechos de leis acima).
  • O seu corpo não deve nunca ser tocado por ninguém sem que você permita. Seja bastante chata quanto a isso, não é natural ser invadida por terceiros e todo incômodo pode ser considerado crime inclusive.
  • Roupa não é permissão. Dança não é permissão. Caminhar não é permissão. A existência da mulher não é um convite para o sexo.
  • O assédio sexual pode se dar por palavras, gestos ou escrito.
  • Não há violência ou grave ameaça em caso de importunação sexual e assédio sexual. Caso haja, se tornam estupros.
  • Cara que ejacula na mulher ou a encoxa em transporte público são exemplos de importunação sexual. Lembrando, sem ameaça ou agressão.
  • Sexo sem consentimento não é sexo, é estupro.
  • Consentimento é concordar - sabendo o que está fazendo e sem sofrer qualquer ameça ou coação para isso.
  • Não há obrigação de servidão sexual para nenhuma mulher. Dizer não também é liberdade sexual.
  • Relações fixas não são livre acesso ao sexo. A esposa/namorada/noiva pode não querer transar e, se o cara forçar, ele é, sim, um estuprador.(NÃO É NÃO, MESMO QUE COM UM CONTRATO DE MATRIMÔNIO)
  • Desistir do sexo depois que já consentiu é direito dos seres envolvidos. Não respeitar isso é estupro. (NÃO É NÃO, AINDA QUE DEPOIS DE UM SIM)
  • Controle de natalidade é decisão que a mulher deve tomar consciente. Obrigar ou proibir o uso de métodos anticoncepcionais viola a liberdade da mulher sobre o próprio corpo, é violência.
  • Compartilhar nudes - que recebeu ou que foi autorizado a fazer num momento de intimidade - é crime. Ter acesso ao corpo ou às imagens não te torna livre para divulgar.
  • Impor sexo sem proteção ou tirar a camisinha sem falar nada são violências sexuais.
  • Te obrigar, mesmo que você não queira, a ter contato com o esperma é violência sexual.
  • Impor quaisquer práticas durante o sexo que você se recusa é violência sexual.
  • Sexo com menores de 14 anos é estupro de vulnerável - não há o que se questionar! É uma criança! A pena é maior para esses casos.
  • Pessoas sob efeito de substâncias psicoativas (álcool ou drogas) podem não ter discernimento para consentir mesmo que aparentem ter. Fazer sexo com essas pessoas também pode ser considerado estupro de vulnerável.
  • Estupro não é só penetração vaginal ou anal. Manipulação erótica ou contato com a boca, por exemplo, em seios, vagina, ânus... são atos libidinosos enquadrados pela definição do crime de estupro.
  • Empregar violência ou grave ameça para beijar uma menina na festa pode ser considerado estupro. 
Em caso de dúvida ou denúncias, a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência - Ligue 180, funciona 24 horas, todos os dias da semana, inclusive finais de semana e feriados, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.

terça-feira, 12 de março de 2019

A violência é: física

O objetivo desta série de textos que vou publicar é ajudar mulheres a reconhecerem situações de violência - este vai tratar especificamente da violência física, os próximos tipos serão abordados em outros posts, certo?

Antes de entrar no assunto, vou explicar rapidinho sobre a fonte que estou usando para abordar as modalidades de abusos: a Lei 11.340. Conhecida como Lei Maria da Penha, foi sancionada em setembro de 2006 e busca coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher (aqui, vou falar especificamente de violência de gênero cometido por familiares, parentes, agregados ou pessoas com quem mantenha ou já tenha mantido alguma relação afetiva - hétero ou homoafetiva). Pelo menos por agora, não vou detalhar muito a Lei, o foco será mantido nas cinco formas de abusos e opressões que ela traz expressamente: físico, psicológico, sexual, patrimonial e moral.

Vamos lá! Primeiro, o que a Lei traz como definição:
Art. 7º  São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
(...) 

Resumindo, a gente vai entender como a violência física aqui toda aquela que o agressor usa a sua força física, direta ou indiretamente, para machucar o corpo da vítima, deixando marcas aparentes ou não

As violências físicas não precisam alcançar extremos para serem configuradas como agressões. As desfigurações decorrentes de espancamento são violência físicas, mas as marcas vermelhas no braço depois de um puxão, ainda que desapareçam rapidamente, também são, os puxões de cabelo ou empurrões, ainda que não deixem resultados visíveis, também são. Não há a necessidade de que a ação resulte em hematomas, fraturas, ou perdas de sangue, por exemplo, para que seja considerada violência física - nem é preciso chegar a este ponto para se reconhecer como vítima.

O agressor pode também não recorrer a sua força diretamente para atentar fisicamente contra a vítima. Vou usar exemplos para ficar mais claro, certo? Empurrar a porta contra a mulher para que ela se machuque, jogar ácido ou água quente em seu corpo, cortar o cabelo da vítima sem consentimento, amarrá-la, privá-la de sono, obrigá-la a ingerir álcool ou drogas são casos de abusos físicos.

Segundo a pesquisa Visível e Invisível – A Vitimização de Mulheres no Brasil 2ª Edição, realizada pelo Datafolha e Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 4,6 milhões de mulheres foram vítimas de agressão física, o que significa dizer que,em 2018, por minuto, cerca de nove mulheres foram violentadas fisicamente no Brasil. As agressões físicas podem resultar também em morte. De acordo com o 12º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados 1.133 feminicídios em 2017, números que levaram o Brasil a concentrar 40% dos feminicídios da América Latina ocorridos no ano. O ano de 2019 mal começou e, somente em janeiro, 119 mulheres foram mortas em razão de seu gênero e 60, sobreviveram a tentativas. É indispensável que o poder público não minimize a gravidade das ocorrências apresentadas pelas vítimas, a violência nos mata dentro de casa - e pode começar com muito menos que um tapa.



E quem é Maria da Penha? Mais uma das vítimas do fenômeno estrutural que é a violência doméstica contra mulheres no nosso país. Ela ficou paraplégica, em 1983, depois de levar um tiro de seu marido, foi mantida em cárcere privado, sofreu outras agressões e nova tentativa de assassinato, também pelo marido, por eletrocussão. O Brasil falhou com Maria da Penha, e o agressor se beneficiava do descaso do Estado. Assim, a vítima recorreu a instituições internacionais, e o seu caso só foi solucionado em 2001, quando nosso país foi condenado por omissão e negligência pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos e teve que se comprometer em reformular suas leis e políticas em relação à violência doméstica. 

quinta-feira, 7 de março de 2019

5 passos para efetivar suas homenagens no Dia da Mulher

Amanhã é dia de procurar aquelas mensagens com imagens de rosas e textos atribuídos a autorias duvidosas para demonstrar o quanto a mulher é importante. Nada contra, mas, como estou em dias com a minha carteirinha de registro de feminista este mês, me senti obrigada a esclarecer aos homens como proceder para terem os selos de autenticidades em suas homenagens.

1º Um ser não é melhor que o outro por ser o macho da espécie.

Eu entendo que o patriarcado te colocou nessa posição de achar que a última palavra é a sua, que a escolha é a sempre sua, a capacidade de prover é sua... Mas, sendo realistas, as diferenças entre homens e mulheres são físicas, biológicas e fisiológicas apenas. Todo o restante, construção social, sacou? Essas coisas que enfiam na cabeça e vão repassando por meio da cultura? Tipo, mulher não dirigir bem, mulher não poder ganhar mais que o homem, mulher ser histérica (a gente não é histérica, a gente é mais forçada a se reprimir e isso pode explodir em algum momento)...

2º Respeitar não é só não passar a mão na bunda. 

Respeitar é enxergar na mulher um ser humano igualmente capaz de agir, pensar e sentir como você. Parece simples, né? Mas, na prática, vocês estão fracassando geral. Vai trabalhando isso em seu interior... Pode começar com a mulher mais próxima mesmo, tipo mãe, irmã, esposa, a mulher que trabalha na padaria... Olhe para ela como alguém além do papel de servidão, alguém que existe para outras coisas que não envolvem atender a suas necessidades ou expectativas.

3º Beleza não é premiável.

Não reduza tudo que uma mulher é ao seus conceitos de beleza. Primeiramente, por toda diversidade que envolve o ser belo, quando você abraça padrões você está sendo limitado e cruel (esse assunto é muito gigante, envolve várias coisas que precisam de cuidado ao serem discutidas e eu não vou me aprofundar agora). Não precisa destacar atributos físicos para elogiar uma mulher. Somos lindas, maravilhosas, gostosas, mas, não é o melhor que somos. Somos inteligentes, temos sorrisos radiantes, somos boas ouvintes, somos resistentes, sabemos lidar com situações difíceis, temos energias incríveis, conseguimos consertar a torneira do jardim como ninguém mais, podemos comer três sanduíches gigantes em 20 minutos... sei lá... Descubra outras coisas que somos e devemos nos orgulhar e receber reconhecimento.

4º Não ser o maior também não te torna o menor.

Aprenda a ouvir e dar valor o que é dito por mulheres. Você não é mais por ser homem e tem muito mais a aprender se notar que, ao lidar com o sexo oposto, tem chances gigantes de aprendizados e trocas - ao invés de ficar desqualificando posicionamentos ou não dando qualquer crédito por virem de uma mulher. A grandeza de cada ser é construída individualmente, não vem embutida no pinto. Ah, em tempos, feminismo é exatamente sobre essa questão de igualdade entre os seres.

5º Dispensadas as suas aprovações.

Mulheres não precisam ser aprovadas pelo senso comum. Logo, você pode se demitir do cargo de juiz de comportamentos ou de fiscal atendimento aos padrões sociais, cara. As coisas estão sendo restabelecidas, não é mais prioridade da mulher ser aprovada por um homem para que, somente assim, tenha valor dentro da sociedade. Nossas conquistas são por nossas motivações, nossos tropeços são por nossos aprendizados, nossas lutas são por nossas necessidades, nossas vivências são por nossas evoluções. 

Ah! E os passos precisam ser seguidos todos os dias da sua vida para que sejam realmente validadas as homenagens do 08 de Março, certo?

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Exagerada não, vítima

É preciso ficar muito claro na nossa mente que não é exagero querer ser respeitada, ainda que isso custe apontar posturas, até então, normalizadas socialmente. Quando entramos em uma relação, não deixamos de ser um ser individualizado, não passamos da condição de gente à de coisa e não nos tornamos propriedade de alguém - e isso cabe a qualquer relação (pode ser namoro, casamento, rolo, paixão platônica... mas, também, com seu pai, seu irmão, seu filho...).

A visão da "proteção" e "provisão" masculina respalda, infelizmente ainda, a dominação do homem, o que, abraçada ao machismo, reduz a mulher a ponto de, infelizmente ainda, torná-la refém de violência cotidiana - seja de violência que causa sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (espia o artigo 7º da Lei Maria da Penha apontando as formas em que acontecem o crime contra a mulher em ambiente doméstico e familiar).

É natural discutir, debater, discordar... Sabe o que não é natural nas ligações entre pessoas? Ser humilhada, ter medo de ser como é ou fazer o que sente vontade, duvidar de você mesma, se anular para manter o outro confortável. Nada vale a sua paz - nem a "vida" que você planeja ou já constrói há anos. 

A questão é que, se reconhecer vítima, não cria também uma blindagem contra a violência e, até aqui, não há o que se discutir sobre a "culpa" da vítima nessa situação. São infinitos os fatores (que variam caso a caso) que impedem um mulher de finalizar uma relação abusiva, geralmente há dependência (principalmente financeira e/ou afetiva) e há o ciclo do abuso (tensão - intimidação/violência aguda - reconciliação - calmaria - tensão - intimidação/violência aguda - reconciliação - calmaria - e recomeça...).

A mulher exposta a esse tipo de violência já ouviu tantas vezes que não é boa o suficiente que, geralmente, internaliza isso como verdade. Por trás da "mulher de malandro" (aff!), há uma pessoa que já foi violada moral e psicologicamente, a ponto de duvidar da sua capacidade de sair ou até mesmo de merecer mais do que o que tem.

O homem violento não precisa usar da força dos seus braços para silenciar e anular a existência de uma mulher. Reafirmar comportamentos de dominação é agressivo e cruel e marca tão profundamente quanto qualquer violência. E isso não torna ninguém mais homem. Muito pelo contrário.


#atencao: haverá posts para esclarecer cada um dos tipos de violência de gênero elencados pela Lei Maria da Penha

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

O monstro não é como dizem

O monstro não tem cara. Ele pode ter ajudado na rifa da igreja, pode ter pagado um lanche para o menino que pediu, pode ter se importado com a violência da qual a vizinha foi vítima. 

O monstro não te causa repulsa. Ele pode ter ensino superior, pode ter um perfil no Instagram, pode ter conhecimento sobre geopolítica.

O monstro não te deixa insegura. Ele pode ter um emprego fixo, pode ter uma família perfeita, pode ser querido em todo o prédio.

O monstro não levanta suspeitas. Ele pode ter te contado sobre problemas com o pai na adolescência, pode fazer parte de um time de basquete, pode ir ao mesmo barbeiro há décadas.

O monstro não te afugenta. Ele pode elogiar seu sorriso, pode tocar violão, pode se lembrar qual sabor de pizza você prefere.

O monstro não te desencoraja. Ele pode escolher bem as palavras, pode ter um gato, pode ser responsável com todos os prazos.

O monstro não vai se esconder. Ele pode ser o xodó da avó, pode frequentar a academia, pode saber agradecer e cumprimentar desconhecidos.

O monstro não vai te encurralar. Ele pode ser bom de cama, pode gostar de séries policiais, pode conhecer toda a sua família.

O monstro não tem histórico assustador. Ele pode estar buscando uma promoção, pode ser contido, pode ler a Bíblia.

O monstro não destrói tudo que toca. Ele pode ser sedutor, pode acertar nos presentes, pode gostar de crianças.

O monstro não é uma aberração. Essa é a razão para poder encontrá-lo em qualquer lugar - no trabalho, na casa ao lado, na família, no Tinder, até mesmo compartilhando sua cama. 

O Brasil ocupa a 5ª posição no ranking de feminicídios entre 83 nações e registra um estupro a cada 11 minutos - nem contos de fada teriam tantos personagens para tornar vilões. Os "monstros" que lidamos são aceitáveis socialmente até serem descobertos pelas monstruosidades que cometem. E isso não é culpa nossa.



Não há o que se discutir sobre culpabilizar vítimas. Abrir sua casa para alguém não o dá o direito de agredi-la. Buscar uma plataforma digital para conhecer pessoas não a torna menos merecedora de respeito. Não conseguir sair de uma relação abusiva não a faz responsável pela violência sofrida. Não há, realmente, o que se discutir sobre culpabilizar vítimas.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Para o amor que eu não quis caber

Já me perdoei pelo peso de ter te querido tanto, de não me controlar sob seu toque, de não deixar você ir completamente, de achar que não conseguiria superar você. Por te enxergar tão grande, acabei cogitando que, talvez, você realmente estivesse certo a meu respeito - e cheguei a ter receio. Seria eu mesma tão pequena a ponto de não conseguir mais do que a sua angústia?

Você não é mais refúgio talvez, exatamente, por ter insistido que meus passos já não dariam conta de uma estrada longe do seu cuidado. Cair em seus braços não é mais necessidade, é um escape que só funcionaria se não houvesse esperas e amanhãs para nossos nós. Já somos partida, por mais que saibamos como nos manter por perto. Já somos as mãos soltas no caminho para casa, ainda que com saudade dos pés laçados na cama. 

Não preciso mais das minhas próprias juras - que não mais te buscarei - nem das suas - por mensagens que nunca chegarão. Não há mais pelo que esperar, não precisamos nos apoiar em meio a nossas loucuras porque aprendemos a tratá-las a sós - apesar de reconhecer a delícia de conversas à mesa e desabafos entre abraços. Um turbilhão de coisas revirou nossa certeza, que não poderia se manter em meio a tantas palavras amargas atropeladas por esperanças cada vez mais vãs.

Acho que nossos caminhos não se desligarão completamente. Você sabe de mim e eu sei de você. Isso é muito para que consigamos nos tornar indiferentes às nossas existências -  mas nem tanto para nos manter ligados. Quaisquer promessas se farão pequenas demais para nos permitir insistir. Falhamos pelo que ansiamos, não pelo que vivemos.

Não aceitar acompanhar seu ritmo não quer dizer que eu não possa dançar. Não sou uma mulher menos incrível por não ter conseguido atender a suas expectativas distorcidas - não sou menos mulher em hipótese alguma. O espaço que quis me manter foi pequeno demais. Doeu, marcou, mas não me reduziu. Todos os dias aprendo mais sobre o lugar em que caibo, e como ele é grande, e como ele é meu. Apesar de ter te dado grande parte dele, do meu espaço, entendi que a força para me apossar de mim novamente é toda minha.

Não se preocupe, ainda não perdi o fôlego. Por mais ar que me falte reconhecer tudo o que você quis me tornar, não me falta um grama de força para continuar sendo o tudo que eu me tornei.

domingo, 6 de janeiro de 2019

Nada colorido

Antes fosse só uma colocação inocente sobre mundos coloridos... Sorry, mas não há referências sobre paletas de cor machão ou mulherzinha na fisiologia humana. Não há nascimento de machos azuis e fêmeas rosas na nossa espécie (isso existe na identificação do sexo nos bebês recém-chegados dentro das famílias que possuem recursos financeiros para tais escolhas). Não há limitações biológicas maiores ou, sequer, do mesmo tamanho que as das expectativas sociais. E, com o mínimo de bom senso que possuirmos, entenderemos que o discurso de rótulos sobre feminilidade e masculinidade é preconceituoso e limitador.

Não gostaria de ter que escrever sobre polêmica cromática, mas, como muita gente insiste em reproduzir o conceito de gênero como padrões que sempre existiram (lá vem o essencialismo), vou esclarecer rapidinho que não é biológica nem sagrada essa padronização... na verdade, ela tem muito mais origem mercadológica! Diretamente sobre rosa de meninas e azul de meninos (ow, Damares!): nós, produtores de comunicação em massa e publicidade tradicionais, atendemos, como tudo na vida, a interesses do capital ($$$), meus anjos, e as cores são poderosas e influenciam diretamente no consumo. Hoje, a gente associa o rosa à "delicadeza" e à "fragilidade" "intrínsecas" à mulher e o azul, à virilidade. Mas não foi sempre assim, isso foi construído muito recentemente inclusive.

"O rosa só se estabeleceu de vez como uma cor feminina na década de 1980. Mas o caminho até lá foi longo. Acompanhe a história: Durante séculos, as tinturas para roupa eram muito caras e crianças de qualquer gênero usavam vestidos brancos até uns 6 anos de idade. Os tons pastéis – entre eles, o rosa e o azul – só começaram a ser associados a crianças no início do século 20, pouco antes da 1ª Guerra Mundial. Na época, porém, ainda não havia uma distinção de gênero estabelecida. Havia até quem defendesse o oposto da norma que vigora hoje: uma artigo de 1918 da Earnshaw’s Infants’ Department dizia que rosa era para meninos e azul para meninas. Isso porque o rosa seria uma cor mais “forte e decidida”; já o azul, mais “delicado e amável”. Perceba que só muda a paleta de cores: o machismo implícito à explicação está lá, intacto." 
Leia a matéria completa: Quando - e por que - o rosa se tornou cor de menina? - Superinteressante

"Até a Primeira Guerra Mundial, nos Estados Unidos, os bebês de ambos sexos eram vestidos com roupas de cor branca. Na época, quando a família decidia colocar um pouco de cor no figurino dos filhos, escolhia azul para uns, rosa para outros. Era rosa para os meninos (por ser uma cor "mais decidida e forte", já que era associada ao vermelho, cor do sangue e vigor), enquanto as meninas usavam o azul (cor considerada naqueles tempos como "mais delicada e amável"). As recomendações sobre essas cores aparecem nos anos prévios à Grande Guerra em revistas como Earnshaw’s , o Ladies’ Home Journal e o The Sunday Sentinel. (...) Somente após a Segunda Guerra Mundial é que a indústria dedicou-se a produzir roupas cor-de-rosa primordialmente para meninas e azuis para meninos. Esse boom do rosa coincidiu nos anos 50 com a chegada do casal Eisenhower à Casa Branca. A primeira-dama Mamie Eisenhower era obcecada com o cor-de-rosa que havia sido amplamente divulgada pela designer italiana Elsa Schiaparelli. (...) As mulheres americanas começaram a imitar o gosto da primeira-dama e também começaram a usar essa cor de forma intensa no cotidiano."
Leia a matéria completa: 11 coisas que talvez você não saiba sobre o intervencionismo cromático - Época

Inclusive, poderiam ser outras cores utilizadas para essas definições - os tons são apenas detalhes nestes condicionamentos. A atenção é voltada ao que há por trás: estereótipos de gênero não são características/tendências naturais. A tábua de ferro rosinha de brinquedo para a menininha e o jogo de construção de cidades em tons escuros para o menininho, em regra, estão deixando bem definido o que se "espera" de cada um: a mulher nasce para aprender a servir, e o homem para direcionar a sociedade. Assim como o kit de maquiagem para as mocinhas e a bola de futebol para os rapazinhos: você, madame, precisa buscar desesperadamente se encaixar a padrões para ser aceita e alcançar a finalidade da sua existência (agradar e conquistar seu provedor) e você, "dono do mundo", deve socializar e criar laços com seus iguais - sem muitas preocupações quanto à própria aparência, porque você tem um pênis, ou aos cuidados com o ambiente em volta, porque você sempre terá uma mulher (vestida de rosa e subserviente) com esta funcionalidade (muda até o cargo, mãe/irmã/namorada/empregada, mas sempre será uma fêmea).

E, pasmem, enxergar isso não é negar as particularidades dos funcionamentos orgânicos a partir do sistema reprodutor, é desmistificar os conceitos de sexo frágil e sexo forte. Sendo bem didática: não rotular as capacidades de acordo com o sexo biológico é ampliar as possibilidades de todos dentro da sociedade. Eu sei, abrir a mente para entender que papéis de gênero são construções egoístas pode te incomodar um pouco mesmo, mas é mais leve viver sem precisar atender às expectativas externas. Sejam quais forem as esperadas de você.