domingo, 23 de setembro de 2018

Reconheça seu lugar

É difícil aprender que você merece ficar bem em tudo que uma relação pode trazer. Ficar bem na cama, na mesa de bar, na frente do espelho, nas ligações perdidas, nas conversas de mais tarde, nas viagens que não deram certo, nos silêncios, nas diferenças, nas certezas e nas dúvidas também... E é tão difícil porque você já viveu/acompanhou desamores suficientes para abalar sua autoestima, histórias pesadas demais que te arrancaram a crença na leveza dos amores, desencantos demais para se autossabotar diante do desinteresse (ou babaquice) do outro. É muito difícil mesmo aprender - especialmente quando você acha estar diante do que seria o melhor sexo da sua vida ou de quem não se incomoda em te acompanhar - que você não deve cortar um centímetro do que é ou do que você merece para caber no lugar que esse alguém tem para te encaixar. 

O processo de aprendizagem é diferente para cada um, inclusive o de se posicionar na vida e nas relações. Entender isso é perceber que não depende só de você o êxito ou fracasso de uma história entre duas pessoas. Assim como você, o lado de lá tem suas limitações - que deverão ser trabalhadas internamente até serem amadurecidas (e você não pode intervir como faz com as bananas compradas verdes na feira, enrolando num jornal e enfiando no forno). Você não tem como assumir responsabilidade alguma com isso na vida de outra pessoa, exceto se for terapeuta do ser em questão. Você é forte à beça, mas esse peso não é carga sua e vai te impedir de se preencher com o que vai te ajudar a ser mais (foge do que suga seus sorrisos, sua sanidade, sua evolução!).

Há espinhos que você traz aí dentro que voltarão a doer se forem apertados. Há marcas que ficarão expostas se você permitir que alguém te molde como melhor lhe convier. Esses pedaços, e tudo mais que já te foi desacerto em algum momento, passaram a ser encarados de outra maneira a medida que você se esforçou e foi se reconstruindo, se tornando o que é. Respeite todos os passos que já deu em terrenos íngremes, as noites insones tentando ficar bem, os sorrisos sem qualquer certeza de que aquilo iria passar. Respeite seu percurso e amadurecimento - eles te fizeram crescer. Você tem tanto a oferecer, não pode aceitar o que não vier completo também.

Não é buscar por alguém perfeito, porque é perda de tempo - na vida real, nem você, nem o Papa Francisco, nem Henry Cavill são assim (por mais que ele pareça muito, é fato que não é). Seu grande encontro deve ser com alguém que você consiga se acomodar sem precisar se diminuir e que possa te acolher como é, sem se incomodar também. Sinta-se confortável ao lado de quem está confortável ao lado da sua grandeza, garota. E você é bem grande (não é arrogância se reconhecer assim), só para constar, ainda que o certo alguém que desperta o sentimento não consiga lidar com isso completamente - o processo evolutivo dele é diferente do seu. O mulherão que você é não deve enfrentar qualquer poda que seja para agradar quem não consegue encarar toda sua intensidade. 


(Eu juro que eu vou levar a sério esse conselho para a minha vida também! Em todos os dias, todos os segundos, todos os "mas, se...")

É verdade esse bilete)

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

É treino

Admiro o cara que gasta gel ornando os fios num penteado tanto quanto a mina que usa seu delineador numa make marota para levantar seus pesos e afins. Eu, na minha realidade - suando feito uma pamonha requentada, descabelada como o próprio sabugo do milho e querendo fugir daquele ambiente como uma pipoca na panela -, não sei ser agradável nem aos olhares alheios. Perdão, pessoas que treinam nas mesmas academias que eu, vocês podem fechar os olhos ao me ver e disfarçar o susto com aquelas caretas de quem tem muitas anilhas para sustentar. Eu tenho me esforçado, ido aos treinos com maior frequência (já sou reconhecida pelos funcionários do espaço), comido menos farofa e mais ovos cozidos, mas, realmente, sinto como se não pertencesse ao ambiente mesmo me empenhando. Tem gente que ama e sente prazer em estar lá, eu, a cada série de agachamento, só sinto vontade de reproduzir aquela cena marcante de GoT:




Agora me explica qual o motivo de eu continuar frequentando um lugar que me causa pesar? Eu tenho uma séria suspeita de que a culpa foi de quando, em algum momento passado da minha vida, eu parei de aceitar o corpo que guardo minha existência devido a expectativas externas. E isso aconteceu cedo demais, eu não tinha nada de maturidade para lidar com isso de outra forma além de aceitar conviver com a frustração eterna de não gostar do que o espelho me mostra. Isso é triste porque faz mal, no mínimo, à minha saúde mental. Isso é sério porque faz mal, no mínimo, à minha saúde mental.

O problema aqui não é a academia ou a cadeira extensora - não tô tentando largar meu projeto. A questão é como tenho me posicionado diante da busca por "padrões" que podem nem ser reais ao estilo de vida ou biotipo que tenho. Tenho sido cruel com meu reflexo no espelho, tenho sido cruel na forma de absorver os comentários alheios sobre o MEU corpo, tenho sido cruel ao ignorar que cada organismo reage de uma forma, ainda que recebendo os mesmo estímulos... E sabe o pior disso tudo? Tem uma porção de mulheres ao meu lado reproduzindo a mesma crueldade com seus corpos e mentes o tempo todo. 

Existe algo muito perverso por trás desses comportamentos de cobranças insanas e que, apesar de toda nossa intelectualidade e protagonismo na busca por mais aceitação e valorização de todas as formas de beleza, nos acerta em cheio - bem no meio do estômago. Já aceitei que isso é real, o
 que eu não vou aceitar nunca é que qualquer ser vivo (ou parasitário) ache que tem o dever de manifestar sua "desaprovação" sobre minha aparência. Estorvo, NÃO FAÇA NINGUÉM SE SENTIR DESCONFORTÁVEL COM O SEU PRÓPRIO CORPO. Pronto. Gritei. 

Você que se acha juiz de físicos, tente ser um ser menos mesquinho. O seu conceito de beleza é seu, foi formado por suas percepções, isso não quer dizer que se sobressai ao das outras pessoas. Pode até parecer um comentário inofensivo no seu ponto de vista, mas você não tem como dimensionar a relação de ninguém com o próprio corpo. Achar que sua opinião é importante e deve ser expressada pode fazer muito mal ao processo de autoaceitação de alguém. Não se incomode se a pessoa está "relaxando com o corpo" (que redução intelectual associar aumento de peso a desleixo) - cuide dos seus próprios ponteiros na balança. Não se incomode se a pessoa está "seca demais" (ou outra observação do tipo: "homem gosta de carne, viu?" - infarto) - sua preocupação continua sendo com o que vai no seu próprio prato. Não se incomode se a pessoa está "muito bombada" - compre um Whey Protein para chamar de seu também, meu bem.

Quanto a nós, sujeitas às loucuras e pressões por "padrões de beleza", o exercício diário é tentar ter a mesma condescendência com você que você tem com sua amiga que é maravilhosa e não consegue se enxergar assim. Tentar aplicar a você o mesmo olhar de admiração por tudo que ela é - mesmo quando jura que não encontra uma roupa que lhe caia bem ou que já tenha sido vencida por três pacotes de Doritos. A pera ser bonita não torna outro tipo de fruta feio - seja melancia, banana ou jaca. 

Eu, por ora, vou manter minha rotina e continuar sendo tão sensual na academia quanto um prato de miojo, porque, posso até ter boa vontade, mas, ainda não tenho a menor paciência para me arrumar para ficar exausta e suada. Quer dizer, depende...

domingo, 9 de setembro de 2018

Enlaçado em nós

Fecha a porta enquanto eu me aninho em sua cama. Vou olhar com desejo para as suas costas nuas e pensar num modo rápido de jogar sua toalha verde no chão do quarto. Deixa a televisão ligada, pouco me importa sobre o que ela canta no meio da noite, nós não vamos perder tempo pensando em tudo que nos levou até ali. Deixa eu te ouvir, mesmo sem dizer nada, só para não perder o encanto de te ver talhando qualquer frase boba com barulho de certeza. 

Não vou segurar o riso, escapando de lado, quando você se desentender com o fecho sob minha camiseta. Mas vou esperar até você começar a reclamar antes de mostrar que é melhor recorrer à destreza que à urgência. Minha atenção, de qualquer forma, vai se voltar para cada centímetro de pele a ser tocado por nosso prazer. Enlaça meus cabelos soltos ao me buscar, prendendo seus olhos nos meus. Minhas mãos também não irão deixar que se afaste. Neste instante, já estarei rendida à dança que você ritmar. Nossos corpos se entendem melhor que nós.

Entre aquelas paredes já conhecidas, nossas curvas se aceitam, sem risco de promessas e versões vãs. Tira meu fôlego com a sua boca, não me importo em perder o ar em sua nuca. Apenas nos deixando levar, tanto faz quem dominar a cena. Enquanto tudo em você me devorar ferozmente, por dentro, não haverá uma porção de mim que não irá querer te prender ao que sou. Sei que caibo em suas mãos, que logo se reconhecem como parte da textura macia da minha tez, por isso não vou me esquivar das suas tentativas de me conter.

Reconheço o perfume da sua pele, saída de banho quente, e vou buscá-lo até me impregnar. Não quero que você se negue a uma vontade nossa que seja. Não há perdas quando a rendição é ao que queima. Por isso, vez ou outra, buscarei um jeito de encontrar seus olhos em meio à nossa desordem - eles sabem o que me dizem, você, não.

Solta seu ar sobre mim, respira pesadamente sobre o meu ouvido. Você sempre se perde quando toco sua fúria, seu medo, sua loucura. Não há espaço para desencaixes quando nos rendemos, só nos resta a vontade de ser. Ser exatamente o que não se poderia ser em qualquer outro lugar. A imprevisibilidade das nossas reações não nos paralisa, é exatamente o não saber o que virá que nos faz querer mais: mais de nós sendo laço. 

A minha intenção ficará clara quando desafiar os seus sentidos. Mesmo sem saber o que se passa por sua cabeça, sei ler o que seu corpo espera. A pouca luz sobre nós não vai me impedir de atiçar todos os seus poros - já que me perder no que possuo de você acaba se tornando minha brincadeira favorita. Recorro ao que te causar arrepios, sussurro o que te desmanchar, derramo o que incendiar o seu ser. A essa hora, nenhuma barreira resistirá à nossa entrega.

Não vamos nos incomodar com a bagunça e o depois. Deixa o lençol desalinhado, nossas roupas esparramadas, nossas urgências esquecidas. Só espero que se lembre de estender seu braço para eu me manter aquecida, entrelaçada ao que sobrou de nós. Não precisaremos de mais nada. Nada além de escolher um filme para o fim da noite e um jeito para recuperar nossas forças. Seu gosto de caos e meu cheiro de ilusão dispensam o que tentar ultrapassar esse jogo.