sábado, 3 de novembro de 2018

Dados lançados

Todos os seres humanos, a grossíssimo modo, são iguais. Trazemos cargas genéticas que já se cruzaram em algum momento na história da evolução, compartilhamos funcionamentos biológicos, bioquímicos, psíquicos tão característicos, precisamos todos de oxigênio para continuar nossas existências... Aí, eu preciso dizer que somos, desde sempre, iguais tratados desigualmente em nossas relações sociais.

"Ai, ela vai começar com mimimi sei quê lá..." Vou começar com "mimimi" sim! Porque, se você enxerga questões de classes como frescura, estão sendo pouco estudadas por você. 

Na teoria, juridicamente, seríamos todos iguais, gozando dos mesmos direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade... (Constituição do Brasil de 88 é muito MARAVILHOSA! Sério! Façam essa leitura!) Na prática, nas convivências, no dia a dia, na labuta para sobreviver em nossa pátria amada, as coisas NÃO SÃO ASSIM. Não são. E sua percepção deve ser bem inocente ou doente se você discorda disso.

O Brasil é machista. É. Machista. Isso mesmo. Moldado para favorecer os homens em detrimento das mulheres e respaldando violências de gênero dentro de uma visão patriarcal nos âmbitos trabalhistas, domésticos, sociais... Por isso, reconhecendo essa deturpação de valores, políticas públicas e leis são criadas para assegurar que esta terra seja um lugar justo e seguro para as fêmeas humanas também. Colocando em números, em dados concretos, apresentados pelo Mapa da Violência 2015 ou pelo Atlas da Violência 2018, o homem hétero tem tanta certeza da sua "superioridade" por aqui que alcançamos as seguintes marcas:
  • 5ª maior taxa de feminicídio do mundo - isso considerando apenas os casos que realmente são notificados por suas circunstâncias ligadas ao gênero. O número de assassinatos de mulheres chega a 4,8 para cada 100 mil brasileiras;
  • 193 mil mulheres registraram ocorrências de violência doméstica no ano passado. A Lei Maria da Penha foi acionada por 530 mulheres por dia - mais ou menos 22 por hora;
  • 164 estupros por dia registrados em 2017 - média de um a cada 11 minutos. Como a notificação à polícia desse tipo de crime é muito baixa, estima-se que este número represente menos de 10% dos casos que realmente acontecem no país.
O Brasil é racista. Não tenho propriedade para falar como vítima aqui, mas é visível o quanto é fácil caracterizar as desigualdades implícitas nas relações cotidianas - mesmo assim, o racismo e a injúria racial são crimes e precisam ser tratados dessa maneira. Toda miscigenação do nosso povo não é o bastante para anular diferenciações sociais baseadas em cor da pele de cada um.
  • De acordo com o Atlas da Violência 2017, a população negra corresponde a maioria (78,9%) dos 10% dos indivíduos com mais chances de serem vítimas de homicídios;
  • Dados do Atlas da Violência 2018 apontaram que a taxa de homicídio, em 2016, foi de 5,3 a cada 100 mil negras; e de 3,1 a cada mil 100 mil mulheres brancas. Uma diferença que chega a 71% entre as raças;
  • Com 726 mil presos, o Brasil tem terceira maior população carcerária do mundo - perde só para EUA e China. Levando em conta a cor da pele, 64% da população prisional são pessoas negras, apontam os dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias apresentados em 2017;
  • Em média, os brasileiros brancos ganhavam, em 2015, o dobro do que os negros: R$1589, ante R$898 mensais, aponta a ONG britânica Oxfam, dedicada a combater a pobreza e promover a justiça social.
O Brasil é homofóbico - líder nas mortes de LGBTs no mundo. As aberrações odiosas cometidas contra gays, travestis e trans mostram o quanto a heteronormatividade deturpa o conceito de igualdade entre os seres humanos - tornando "repulsiva" e "banal" a existência de quem diverge da categorização rígida de uma cultura patriarcal. Dados do levantamento realizado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) em 2017 confirmam isso:
  • Foi registrada uma vítima fatal a cada 19 horas em consequência de preconceito quanto à sua sexualidade.
  • Das 445 mortes registradas em 2017, 194 eram gays, 191 eram pessoas trans, 43 eram lésbicas e cinco eram bissexuais;
  • O ódio por essa população só aumenta. O saldo de crimes violentos em 2017 foi três vezes maior do que o observado há 10 anos.
Ou seja, os seres humanos são percebidos igualmente na nossa sociedade desde que sejam homens, brancos e héteros. Ah! E sem limitações físicas ou cognitivas, sejam seguidores de religiões Cristãs, tenham fonte de renda assegurada, sejam moradores de zonas urbanas "desenvolvidas" e sejam indiferentes a ativismos e movimentos sociais.

Daí, a importância de tanto "mimimi". Ter aparato jurídico ou assistencialista, claro, não modifica magicamente toda uma construção de sociedade, mas, começa a mostrar para vítimas que o Estado quer combater essas injustiças e que os agressores deverão ser reconhecidos por seus crimes - porque não, nenhum ser humano deve se sentir seguro para inferiorizar ou violentar o seu semelhante "diferente", ainda que isso seja sistêmico.

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